Esse
é um post longo que eu demorei muito “a escrever”. Na verdade,
contarei agora a história de uma lesão que me demandou quase dois
anos de tratamento e recuperação – a maior lesão da minha vida.
Brincarei
com a igualmente longa série Game of Thrones
a fim de deixar o post mais lúdico.
E
na parte útil do post, vamos discutir um pouco se a medicina está
doente, pegando o mote da Revista Superinteressante.
Então,
“senta, que lá vem a história”.
1a
TEMPORADA: The Winter is Coming
Em
setembro de 2015, no nosso racha oficial
de sábado, eu
cheguei com tudo à linha de fundo e girei ao máximo o quadril para
cruzar a bola para o meio da área. Travei
a corrida imediatamente porque não havia mais campo. Nessa hora, eu
ouvi um “truco” e senti que tinha feito “merda”.
Eu
achei que era uma distensão muscular e esperei todos os prazos para
a minha autorrecuperação: 15, 30, 45 dias e nada… Hora de
procurar ajuda médica.
O
exame de raio X não indicou nenhuma fratura e partimos então para a
ressonância magnética.
É
aquele exame claustrofóbico que você entra dentro de um tubo
apertado,
com frio e muitos barulhos assustadores e precisa ficar imóvel por
uns 20 minutos.
O
laudo do exame indicava que eu tinha… nada.
Mas
o ortopedista detonou esse laudo e disse que uma determinada
manchinha branca não sei onde lá no exame era um sinal de bursite
trocantérica.
Basicamente,
inflamação nas bolsas que amortecem o impacto do fêmur (trocânter)
com os músculos da bacia. Coloque
a mão direita na lateral do seu quadril e saberá do que eu estou
falando.
Nessa
temporada de Game Of Thrones, eu tinha que fazer 10 sessões de
fisioterapia – 1 para cada episódio.
2a
TEMPORADA: The
North Remembers
E
era a fisioterapia por atacado patrocinada pelos planos de saúde.
Clínicas loooootadas, com muitos pacientes idosos e poucos
profissionais para dar conta de tudo.
Infelizmente,
não dá para fazer tratamentos personalizados e o tratamento vai no
atacado mesmo, com os equipamentos disponíveis: choque, calor, gelo,
ultrassom, bicicleta, fitas, elásticos…
Num
desses dias, eu ouvi o pessoal do administrativo da clínica
conversando e descobri que o meu plano pagava à clínica 14
REAIS por sessão!
Pior ainda, foi quando eu constatei que o meu plano era o
que pagava
mais.
Eu
perdia a manhã inteira para fazer toda a fisioterapia e conseguir,
enfim, chegar ao trabalho. E
foi por conta disso que resolvi entregar o meu cargo de gestão na
empresa onde trabalho:
para
poder me dedicar plenamente à minha saúde.
As
minhas dores aumentavam e eu temia estar fazendo os exercícios da
fisioterapia de maneira equivocada.
Nessa
brincadeira, fiz 30 episódios, digo, sessões de fisioterapia, já
era 2016 e eu decidi procurar um ortopedista especialista em quadril.
3a
TEMPORADA: The
Rains of Castamere
Ele
me pediu para refazer a ressonância magnética em uma clínica
específica que, supostamente, possuía uma máquina melhor.
Óbvio
que o plano de saúde odiou a ideia, mas, cumpridas algumas
burocracias, liberou o novo exame.
Na
hora de fazer o exame, os médicos perguntam onde está doendo. Claro
que é preciso direcionar o exame. Mas eu também fiquei bem cismado.
Parece que eles querem a qualquer custo achar
alguma justificativa para as dores nas imagens.
E
foi nessa brincadeira que eu ganhei um novo laudo apontando QUATRO
PROBLEMAS!
O
ortopedista falou que iniciaria o tratamento obviamente pela parte
mais light, ou seja, pela fisioterapia, mas, se não resolvesse, ele
poderia me operar.
Dada
a gravidade dos fatos, eu optei por pagar pela fisioterapia, abrindo
mão da ajuda do plano de saúde.
E
aí, era outro nível. Tratamento com hora marcada e um profissional
te atendendo exclusivamente durante uma hora, ao custo de 80 R$.
Incluímos até RPG no tratamento, mas as coisas não iam bem.
Se
as dores na região da bursite diminuíam, eu já começava a sentir
dores espalhadas em várias regiões do quadril. Às vezes, dores
imobilizantes.
Nessa
época, eu trabalhava em pé praticamente o dia inteiro para as
queixas dos meus colegas.
Foi
quando a fisioterapeuta abriu: vou fazer um laudo do seu tratamento e
você vai lá conversar com o médico sobre essas novas dores.
(Nessa
temporada, eu também me encontrei com um dentista para fazer um
tratamento de canal. Eu havia encontrado um vídeo no Youtube de um
rapaz que só curou 4 anos de bursite quando tratou um problema
dentário.)
4a
TEMPORADA: First
of His Name
Lá
chegando, fui muito mal recebido.
Ele
disse que não poderia me atender porque a
cooperativa médica estava renegociando melhores remunerações com o
meu plano de saúde. Todos os ortopedistas da cooperativa
(acho que todos do Ceará) estavam proibidos de atender pelo plano
casos que não fossem de urgência.
E
óbvio que ele disse que a minha dor FDP não era caso de urgência
tanto que eu já estava convivendo com ela há meses. Óbvio também
que ele disse isso porque a dor não era ele quem estava sentindo.
Além
da queda, o coice. Eu fui muito humilhado. Você paga um absurdo em
impostos para manter o SUS e ele te deixa na mão. Você paga um
absurdo a um plano de saúde e, quando precisa, ele te deixa na mão.
Você confia na ética médica e no juramento e isso não serve pra
nada se não houver grana no meio. E o pior de tudo era a dor e o
pensamento que nenhum médico do Ceará iria me atender.
Atendendo
a conselho de um amigo, fui ao terceiro ortopedista. Paguei uma
consulta em um ortopedista de confiança que já tinha me tratado
outras vezes. É legal que, para marcar uma consulta pelo plano, só
tem vaga pra daqui a não sei quantas semanas. Mas, pagando em cash,
você consegue vaga PRA HOJE. Tanto que eu não estava com os exames
e precisei ir buscá-los antes da consulta.
O
diagnóstico dele foi de pequena lesão no labrum – que é o
ossinho onde o fêmur se “encaixa” no quadril.
A
lesão cicatrizaria sozinha. Caso contrário, somente poderia ser
resolvido com intervenção cirúrgica.
Ele
me deu um remédio muito louco para bloquear a dor. E isso foi a
minha morfina durante 8 semanas. Realmente, eu estava no paraíso
(sem dores). Mas os efeitos colaterais eram pesados e, às vezes, eu
sentia umas vertigens.
Eu
deveria tomar o remédio à noite uma vez que ele dava sono. Mas,
depois de duas noites acordados, passei a tomá-lo pela manhã.
Acabado
o remédio mágico, as dores voltaram com tudo e ele só me passou o
contato de um colega que operava.
5a
TEMPORADA: The
Dance of Dragons
E
aí? Só particular? Será que o plano vai me ajudar? Pago o médico
e o plano paga o hospital? Tem consulta pra quando? Quantos dias de
burocracia? Terei a grana? Como será o pré e o pós-operatório?
Ainda andarei? PQP!
Enquanto
esperava a temida consulta, recorri a um quarto ortopedista. Ele me
disse que não sabia o que eu tinha, estava curioso com o meu
diagnóstico, e, o que mais me marcou: o médico
que me operasse simplesmente com base naqueles exames deveria ser
processado. Se eu realmente tinha alguma coisa, era leve
demais para merecer uma cirurgia que praticamente me deixaria
aleijado.
Mas
eu não estava louco ainda. Triplo PQP carpado!
Finalmente,
eu estava frente a frente com um dos dois médicos do Ceará que
operavam quadril por vídeo (somente dois ou três furos no corpo em
vez de um corte longitudinal completo).
Ele
viu e ouviu tudo e deu o veredicto: realmente, você tem indicação
para fazer a cirurgia, mas ela não vai
resolver nem 70% das suas queixas.
Nessa
hora, não tinha mais nem como categorizar a minha loucura e o meu
PQP.
Daí,
ele achou melhor começar pianinho e fazermos um tratamento com um
coquetel de drogas, algumas fitoterápicas. Eu me lembro bem dele
tirando várias caixas de amostras grátis das gavetas. E já me
pediu dezenas de exames que também seriam úteis para a futura
cirurgia.
Somente
nesse tempo, eu ouvi a minha prima médica me recomendando uma
reumatologista.
Marquei
e fui.
6a
TEMPORADA: Battle
of the Bastards
Lá
chegando fui recebido por uma jovem médica, muito simpática e
agradável, muito gata. S2.
Ela
detonou a minha postura corporal e o meu tratamento experimental. Não
havia estudos comprovando que aqueles remédios serviam para o meu
problema.
Ela
disse que a minha musculatura estava toda
travada e isso é o que explicava as dores generalizadas. O
meu tratamento era ir pra academia. UAU!
E
fez uma infiltração – injeção de anti-inflamatório dentro da
articulação.
E
eu voltei à academia depois de não sei quantos anos.
Fiquei
assim algumas semanas, sob efeito dos anti-inflamatórios e esperando
os resultados da musculação.
Nesse
meio tempo, a gente viajou de férias e um item obrigatório da
bagagem era a bolsa de gelo que já me acompanhava há um ano. Em
cada hotel que a gente fazia check in, a primeira providência era
colocar a bolsa de gelo no frigobar. Era bizarro.
7a
TEMPORADA: A
Longa Caminhada
Voltando
das férias, fui me encontrar com uma nutricionista. A partir dali,
eu emagreceria 8 quilos em 100 dias e tenho convicção de que isso
ajudou na minha cura. Mas isso é tema de um outro post quem sabe no
futuro.
Voltando
das férias, recorri a um osteopata/fisioterapeuta que um amigo
indicara. Só depois fiquei sabendo que ele era o coordenador da
fisioterapia do Fortaleza Esporte Clube.
Ele
me disse que não queria ser mais um ator do meu Game of Thrones. Eu
disse que ele já era, mas precisava ser o último.
Lá
na clínica eu senti outra vibe. Havia muitos atletas (profissionais
ou não) se tratando lá. Senti firmeza desde a chegada.
Ele
fez a sessão de osteopatia recolocando todas as minhas articulações
no lugar e me direcionou à sua esposa – fisioterapeuta.
Ela
diagnosticou que o meu músculo interno
(virilha) estava travado e era isso o que estava arrebentando com os
músculos externos.
O
tratamento era manipulação dos músculos através de terapia
manual, além de exercícios. É uma espécie de massagem
só que traz a maior dor que você pode sentir. Às vezes, eu
achava que ela queria arrancar o meu músculo para colocar em um
quadro. Sempre 10 ou 15 minutos de tortura, com direito a lágrimas,
murmúrios, gritos e xingamentos.
A
ideia era ativar e fortalecer todos os músculos, restabelecendo a
biomecânica natural.
E
é incrível como aquele negócio funciona. Tanto que alguns
pacientes a apelidaram de “minha malvada favorita”. Num lance bem
sádico, a gente sempre voltava lá para pagar mais 80 R$ e sofrer
mais nas mãos dela e da sua equipe.
Claro
que a gente só voltava porque via os resultados mágicos do
tratamento.
Aos
pouquinhos, eu fui passando pelas massagens, pelos exercícios, até
chegar ao Pilates. Mais um pouco e eu já estava na esteira.
CORRENDO!
Lembro
da fisioterapeuta falando: “cara, é nessas horas que a nossa
profissão recompensa. A tua alegria correndo nessa esteira não tem
preço”.
E
eu a subornei com alguns chocolates e ela me liberou para o último
racha do ano:
Parecia
um mero detalhe, mas o suficiente para eu dizer que joguei futebol em
2016. Assim como em todos os anos da minha vida.
O
maior ensinamento dela foi uma massagem com
bolinhas terapêuticas. Simplesmente, posicionar as bolinhas
sob os músculos lesionados e se deitar sobre elas por algum tempo.
Isso faz o serviço de ativação da musculatura – que faz a mágica
toda funcionar.
(Nessa
temporada, eu também apelei para a minha psicóloga. Não havia
alternativas: ou eu ficava doido de vez ou eu ficava bom do quadril.)
8a
TEMPORADA: {Imagine
um título}
[Imagine
uma foto]
Agora,
eu estou voando.
Há
pouco, eu fiz um gol como nos velhos tempos, dando uma arrancada de
30 metros em altíssima velocidade. Que satisfação!
Voltei
a jogar futebol 2 vezes por semana, às vezes, alternando com
corridas.
Além
desses 2 treinos aeróbicos semanais, também faço musculação 2
vezes por semana, mantendo tudo em ordem.
As
metas para 2017 incluem: praticar esportes 3
vezes por semana; correr 200 km e correr pelo menos 5 provas
oficiais.
A
primeira corrida eu narrei aqui:
A segunda corrida foi a Night Run no último sábado. E vem aí a
MARATONA! :P
E
sempre que eu sinto algum incômodo ou lembrança de dor, já recorro
às bolinhas.
No
fim, escapei de duas cirurgias e de ficar aleijado aos 30 anos.
Pensei
muito em abandonar o futebol, mas voltei a praticar com total
confiança, pois tenho o telefone da minha malvada favorita e equipe.
Obrigado
a todos que me ajudaram nessa longa série.
Aos
amigos que sempre me aconselharam e me transmitiram força
psicológica, pensamentos positivos e orações.
A
todos os profissionais de saúde que estiveram ao meu lado tentando
me curar.
À
minha família pelo suporte, principalmente, à minha amada esposa
Alânia Tavares, grande parceira na saúde e na doença.
#Tamujunto
Fiquem
com Deus.
Ei, psiu, se liga…
Dá para ficar sabendo das novidades do blog pelas redes sociais. Sigam-me os bons!
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